sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

pilulinha 35

A poesia de Elesbão Ribeiro, cujo primeiro livro, Estação piedade, traz o frescor de um olhar não viciado sobre a cidade, possui uma deriva especial. Os versos bem medidos, sem excessos, enxutos, criam uma expectativa no leitor que resulta do caldo cultural que perpassa a cidade nestes últimos quarenta anos.

Desde os cinemas dos bairros que se transformaram em templos religiosos às festas populares como a celebração de Cosme e Damião, a poesia de Elesbão Ribeiro associa uma nova perspectiva, um olhar inusitado, apaixonado, mas crítico, do espaço urbano, que ultrapassa os limites dos bem falantes e repetitivos poetas cariocas, com as suas figuras de sempre, os cristos, os corcovados, as praias. Recolhe em si o melhor Bandeira e o distende até uma dicção que lhe é própria.  

O sotaque de piscar o olho para a herança portuguesa convive com maestria com a boa malandragem, em seus recantos mais sutis, da linguagem da cidade. Assim, as percepções da alma e do corpo, sobretudo o feminino, se entregam a uma aguda sondagem da presença, em linguagem, de uma especificidade tanto corrente quanto inusitada. O triângulo isósceles da mulher de Tales de Mileto se transforma numa bem sabida, esperta, – anoto que o adjetivo aqui melhor descreve a poesia do autor – teoria geométrica que ao mesmo tempo se descreve no seu reverso.

O bom negro, o bom branco e o bom sotaque d’além-mar, em Estação piedade, gingam no corpo das belas mulheres, no olhar deste poeta surpreendente em que se constitui Elesbão Ribeiro.


(oswaldo martins)

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