segunda-feira, 9 de março de 2015

o capote

1

o capote anda pela cidade
nada há nele
nem o braço nem a pança
de alguém

anda com sua alma de vento

2

com sua alma de vento
ginga nas gafieiras
o busto das estátuas
são seu estuário

o capote é uma figura ingente

3

esta figura ingente
abarca com as mangas
os quadros dos museus
e furta uma carícia

à moça que olha o quadro

4

a moça que olha o quadro
sente nas coxas o olhar
os braços do capote
que a enlaçam

mais de perto a moça olha

5

a moça mais perto olha
já não vê o quadro
nada e ninguém
apenas o comichão

toma lhe a as partes

6

as partes da moça
se molham e o quadro ali
já não dispunha-se a ser
olhado o capote queria

avultar-se em em ação

7

a violência do capote
derruba a moça
faz os olhos pasmos
saltam os botões da blusa

o capote guarda-os no bolso

8

as pernas da moça se mexem
lentamente sobe-lhe a saia
e a mão com força abre
os lábios e geme

o capote deita-se sobre

9

a moça percebe a luz
que a envolve e entontece
o quadro gira na cidade
escura e o capote pontua

a cena dos visitantes

10

o capote com sua luz
constrói a desilusão
de quem a cidade toma
por cidade o capote por

capote e o quadro por museu


(oswaldo martins)

Nenhum comentário:

Postar um comentário