sexta-feira, 9 de junho de 2017

Memórias sentimentais de um leitor randômico

1

Jorge Amado, no A descoberta da América pelos turcos, vai, nas primeiras páginas da novela, classificar as bocetas. A classificação que mais chamou minha atenção – até porque a personagem principal é detentora de uma – foi a boceta de chupeta. O desgraçado me fez até hoje buscar por essa boceta – néctar dos deuses.

2

Foi no Emissário do Diabo, de Gilvan Lemos, que li pela primeira vez a proximidade de Deus com o sexo. Não com o sexo etéreo dos anjos, mas o sexo carnal, lambuzado e sofrido, como uma consciência pesada. Desde então tenho procurado desafiar as alturas do divino.

3

Li – não sei mais onde – uma entrevista, decerto – um autor alemão dissertar sobre a questão da leitura, ou melhor, do gosto pela leitura. Dizia o tedesco que fez seus filhos se apaixonarem por livros, deixando no banheiro alguma obra libertina, como se fosse um esquecimento. Apliquei o método com meus filhos. Acho que deu certo. Por isto, agradeço ao Decamerão, ao grande poeta português Bocage e ao velho Aretino. Entretanto, agradeço à boa literatura que Henry Miller nos deixou, certo gosto por obras ousadas e pelas nomeações claras dos desejos.

4

Mais que por Bukowski, encantei pela nudez de Ornella Mutti que contracena com Bem Gazarra, no filme de Marco Ferreri, Crônica de um amor louco. Depois que li o americano, continuo preferindo o filme.

5

José de Alencar é bom para fazer chorar, de raiva.

6

O livro de contos do Carlos Drummond. Como contista, o poeta mineiro é tão ruim como o Machado poeta, com aquelas baboseiras sobre a Carolina. Romântico e babão.

7

Junikiro Tanizaki tem um livro que me encanta mais que os outros escritos por ele. Elogio da sombra. Entre as diversas narrativas e descrições preciosas que nos dá, diverte-me imaginar que os haicais tenham sido escritos enquanto os poetas, fazendo uso dos belos banheiros da tradição japonesa, se demoravam a ouvir o barulho do riacho que lhes levava as fezes e permitia a permanência das sensações. Depois disso achei os do Leminski, poeta curitibano meio bobos.

8

Agrada-me menos a voz possante do velho deus da Bíblia. Mais a voz mansa de Safo e dos amores ilícitos. Salvo os cânticos de sacanagem de Salomão.

(oswaldo martins)

2 comentários:

  1. Meu caro Osealdo. Essas narrativas, junto com as outras tuas, de memórias mais factuais, de Minas ( o que as faz não serem Ta o factuais - Minas não há mais) dão um Belo livro.

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  2. Meu caro Osealdo. Essas narrativas, junto com as outras tuas, de memórias mais factuais, de Minas ( o que as faz não serem Ta o factuais - Minas não há mais) dão um Belo livro.

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